Mário de Miranda Quintana (Alegrete, 30 de julho de 1906 — Porto Alegre, 5 de maio de 1994) Poeta, tradutor e jornalista brasileiro.
Mário Quintana descreveu a si próprio, em 1984: “Nasci em Alegrete, em 30 de julho de 1906. Creio que foi a principal coisa que me aconteceu. E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. Bem! Eu sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente. Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão. Nasci no rigor do inverno, temperatura: 1 grau; e ainda por cima prematuramente, o que me deixava meio complexado, pois achava que não estava pronto. Até que um dia descobri que alguém tão completo como Winston Churchill nascera prematuro — o mesmo tendo acontecido a sir Isaac Newton! Excusez du peu… Prefiro citar a opinião dos outros sobre mim. Dizem que sou modesto. Pelo contrário, sou tão orgulhoso que acho que nunca escrevi algo à minha altura. Porque poesia é insatisfação, um anseio de auto-superação. Um poeta satisfeito não satisfaz. Dizem que sou tímido. Nada disso! Sou é caladão, introspectivo. Não sei porque sujeitam os introvertidos a tratamentos. Só por não poderem ser chatos como os outros? Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese. Outro elemento da poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das palavras. Talvez concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de farmácia durante cinco anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de Andrade, de Alberto de Oliveira, de Erico Verissimo — que bem sabem (ou souberam) o que é a luta amorosa com as palavras”.
Os poemas abaixo foram publicados no livro “Mario Quintana — Poesia Completa”, editora Nova Aguilar.
- A rua dos Cataventos
"Aves da noite! Asas do horror! Voejai! Que a luz trêmula e triste como um ai, A luz de um morto não se apaga nunca!"
- Do amoroso esquecimento
"Eu agora — que desfecho! Já nem penso mais em ti… Mas será que nunca deixo De lembrar que te esqueci?"
- Segunda canção de muito longe
"Vamos ouvir o ruído cantado, o ruído arrastado das correntes no algibe, Puxando a água fresca e profunda. Havia no arco do algibe trepadeiras trêmulas. Nós nos debruçávamos à borda, gritando os nomes uns dos outros, E lá dentro as palavras ressoavam fortes, cavernosas como vozes de leões."
- Emergência
"Quem faz um poema abre uma janela. Respira, tu que estás numa cela abafada, esse ar que entra por ela. Por isso é que os poemas têm ritmo — para que possas profundamente respirar. Quem faz um poema salva um afogado."
- Poeminho do Contra
"Todos esses que aí estão Atravancando meu caminho, Eles passarão… Eu passarinho!"
- Relógio
"O mais feroz dos animais domésticos é o relógio de parede: conheço um que já devorou três gerações da minha família."
- Os Poemas
"Os poemas são pássaros que chegam não se sabe de onde e pousam no livro que lês."
- Esperança
"Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano Vive uma louca chamada Esperança E ela pensa que quando todas as sirenas Todas as buzinas Todos os reco-recos tocarem Atira-se E — ó delicioso voo! Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada, Outra vez criança… E em torno dela indagará o povo: — Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes? E ela lhes dirá (É preciso dizer-lhes tudo de novo!) Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam: — O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA…"
- Envelhecer
"Antes, todos os caminhos iam. Agora todos os caminhos vêm A casa é acolhedora, os livros poucos. E eu mesmo preparo o chá para os fantasmas."
- Tic-tac
"Esse tic-tac dos relógios é a máquina de costura do Tempo a fabricar mortalhas."
Fonte: Revista Bula, Coluna de Carlos Willian Leite
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