Cidade e as Serras, A
livro de Eça de Queirós
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A Cidade e as Serras é um romance de Eça de Queiroz. Neste livro, Eça faz uma comparação entre a vida módica e agitada de Paris e a vida tranqüila e pacata na cidade serrana de Tormes.
- “Foi então que meu príncipe começou a ler apaixonadamente desde o Eclesiastes até Schopenhauer, todos os líricos e todos os teóricos do pessimismo. Nessas leituras encontrava a reconfortante comprovação de que o seu mal não era mesquinhamente “Jacíntico” – mas grandiosamente resultante de uma lei universal. Já há quatro mil anos, na remota Jerusalém, a vida, mesmo nas delícias mais triunfantes, se resumia em ilusão.”
- “E a cada um destes esforços da elegância, do humanitarismo, da sociabilidade, e da inteligência indagadora... Arrebatava então o seu Eclesiastes, o seu Schopenhauer, e estentido no sofá, saboreava voluptuosamente a concordância da doutrina e da experiência. Possuía uma fé – o pessimismo, era um apóstolo rico e esforçado; e tudo tentava, com suntuosidade, para provar a verdade de sua fé.”
- "Arrastei então por Paris dias de imenso tédio. Ao longo da boulevard revi nas vitrinas todo o luxo, que já me enfartara havia cinco anos, sem uma graça nova, uma curta frescura de invenção. Nas livrarias, sem descobrir um livro, folheava centenas de volumes amarelos, onde, de cada página que ao acaso abria, se exalava um cheiro morno de alcova e de pó-de-arroz, entre linhas trabalhadas com efeminado arrebique, como rendas de camisas. Ao jantar, em qualquer restaurante, encontrava, ornando e disfarçando as carnes ou as aves, o mesmo molho, de cores e sabores de pomada, que já de manhã, em outro restaurante, espelhado e dourejado, me enojara no peixe e nos legumes. Paguei por grossos preços garrafas do nosso adstringente e rústico vinho de Torres, enobrecido com o título de Château isto, Château aquilo, e pó postiço no gargalo. À noite, nos teatros, encontrava a cama, a costumada cama, como centro e único fim da vida, atraindo, mais fortemente que o monturo atrai os moscardos, todo um enxame de gentes estonteadas, frementes de erotismo, zumbindo chacotas senis. Esta sordidez da planície me levou a procurar melhor aragem de espírito nas alturas da colina, em Montmartre; e aí, no meio de uma multidão elegante de senhoras, de duquesas, de generais, de todo o alto pessoal da cidade, eu recebia, do alto do palco, grossos jorros de obscenidades, que faziam estremecer de gozo as orelhas cabeludas de gordos banqueiros, e arfar com delícia os corpetes de Worms e de Doucet, sobre os peitos postiços das nobres damas. E recolhia enjoada com tanto relento de alcova, vagamente dispéptico com os molhos de pomada do jantar, e sobretudo descontente comigo, por me não divertir, não compreender a cidade, e errar através dela e da sua civilização superior, com a reserva ridícula de um censor, de um Catão austero. Ó senhores! - pensava - pois eu me divertirei nesta deliciosa cidade? Entrará comigo o bolor da velhice?"
- "E os pedaços de soalho levantado mostravam tristemente, como num cadáver aberto, todos os interiores do 202, a ossatura, os sensíveis nervos de arame, os negros intestinos de ferro fundido."
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