Simone Weil: diferenças entre revisões

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==Citações por categoria==
 
===Sobre as causas da liberdade e da opressão social (1934)===
 
* "[...] O verdadeiro tema da Ilíada é a dominação da guerra sobre os guerreiros, e, por seu intermédio, sobre todos os humanos; ninguém sabe por que cada um se sacrifica, e sacrifica todos os seus numa guerra assassina e sem objetivo; é por isso que, ao longo de todo o poema, é aos deuses que se atribui a influência misteriosa que desmancha todas as conferências de paz, reacende continuamente as hostilidades, traz de volta os combatentes que um lampejo de razão leva a abandonar a luta."
 
* "Assim, nesse antigo e maravilhoso poema aparece já o mal essencial da humanidade, a substituição dos fins pelos meios. Ora a guerra aparece em primeiro plano, ora a procura da riqueza, ora a produção, mas o mal continua o mesmo. Os moralistas vulgares se queixam de que o homem é arrastado por seu interesse pessoal; oxalá fosse isso! O interesse é um princípio de ação egoísta, mas limitado, razoável, que não pode gerar males ilimitados. A lei de todas as atividades que dominam a existência social, é, ao contrário, excetuando-se o caso das sociedades primitivas, que cada um sacrifique a vida humana, em si mesmo e em outrem, por coisas que não passam de meios de viver. Esse sacrifício se reveste de diversas formas, mas tudo se resume na questão do poder. O poder, por definição, não passa de um meio; ou, mais exatamente, possuir um poder consiste simplesmente em possuir meios de ação que ultrapassam a força tão restrita de que um indivíduo dispõe sozinho. Mas a procura do poder, pelo fato de ser essencialmente impotente para agarrar seu objeto, exclui toda consideração de fim, e chega, por uma inversão inevitável, a tomar o lugar de todos os fins. É essa inversão da relação entre o meio e o fim, é essa loucura fundamental que explica tudo o que há de insensato e sangrento no curso da história. A história humana é apenas a história da escravização que torna os homens, tanto opressores quanto oprimidos, simples joguetes dos instrumentos de dominação que eles mesmos fabricaram, rebaixando, assim, a humanidade viva a ser a coisa de coisas inertes."
 
* "Como Marx compreendeu claramente com relação ao capitalismo, como alguns moralistas perceberam de uma forma mais geral, o poder encerra uma espécie de fatalidade que pesa tão impiedosamente sobre os que comandam quanto sobre os que obedecem; mais ainda, é, na medida em que ele sujeita os primeiros, que, por intermédio deles, esmaga os segundos. [...]"
 
* "[...] Pois, como não há nunca poder, mas apenas corrida ao poder, como essa corrida é sem termo, sem limite, sem medida, não há também limite nem medida para os esforços que ela exige; os que se lhe entregam, pressionados para fazerem sempre mais do que seus rivais, que, por sua vez, se esforçam para fazerem mais do que eles, devem sacrificar não somente a existência dos escravos, mas a sua própria e a dos entes mais queridos; assim Agamenon imolando sua filha renasceu nos capitalistas que, para manterem seus privilégios, aceitam levianamente guerras suscetíveis de lhes arrebatarem os filhos. [...]"
 
* "Mais ainda, as duas lutas que cada homem poderoso deve travar, uma contra aqueles sobre os quais reina, e a outra contra os seus rivais, se misturam inextricavelmente e sem cessar uma acende a outra. Um poder, seja qual for, deve sempre tender a afirmar-se no interior, por meio de sucessos obtidos no exterior, pois esses sucessos lhe dão meios de coação mais poderosos; além disso, a luta contra os rivais alia a seu séquito seus próprios escravos, que têm a ilusão de estarem interessados no resultado da luta. Mas, para conseguir que os escravos obedeçam e se curvem aos sacrifícios indispensáveis para uma luta vitoriosa, o poder deve tornar-se mais opressivo; para estar à altura de execer essa opressão, é ainda mais imperiosamente forçado a se voltar para o exterior, e assim por diante. Pode-se percorrer a mesma corrente partindo de um outro elo; mostrar que um agrupamento social, para estar à altura de se defender contra as potências exteriores que desejariam anexá-lo, deve submeter-se a uma autoridade opressiva; que o poder assim estabelecido, para se manter no lugar, deve atiçar os conflitos com os poderes rivais; e assim por diante, mais uma vez. Assim é que o mais funesto dos círculos viciosos arrasta toda a sociedade atrás de seus senhores numa ronda insensata."
 
* "[...] toda vitória sobre os homens encerra em si mesma o germe de uma possível derrota, a menos que se vá até a exterminação. Mas a exterminação suprime o poder suprimindo o objeto. Assim, há na própria essência do poder uma contradição fundamental que o impede de existir propriamente; os que chamamos de senhores, continuamente pressionados para reforçar seu poder - sob pena de o ver usurpado -, estão sempre atrás de uma dominação essencialmente impossível de possuir, perseguição de que os suplícios infernais da mitologia grega oferecem belas imagens. Seria diferente se um homem pudesse possuir em si mesmo uma força superior à de muitos outros reunidos; mas isso nunca se dá; os instrumentos do poder, armas, ouro, máquinas, segredos mágicos ou técnicos, sempre existem fora daquele que dispõe deles, e podem ser tomados por outros. Por isso todo poder é instável."
 
* "[...] Nunca o indivíduo esteve tão completamente entregue a uma coletividade cega, e nunca os homens foram mais incapazes, não só de submeter suas ações a seus pensamentos, mas até de pensar. [...] A razão desse doloroso estado de coisas é bem clara. Vivemos num mundo onde nada está na medida do homem; há uma desproporção monstruosa entre o corpo do homem, o espírito do homem e as coisas que constituem atualmente os elementos da vida humana; tudo é desequilíbrio.[...]"
 
* "[...] o homem nada tem de essencialmente individual, nada tem que lhe seja inteiramente próprio, a não ser a faculdade de pensar; [...] Por isso, se o que se quer é formar, de um modo puramente teórico, o conceito de uma sociedade na qual a vida coletiva seja submetida aos homens considerados como indivíduos, em vez de submetê-los, é preciso apelar para uma forma de vida material na qual só interviriam esforços exclusivamente dirigidos pelo pensamento claro, o que implicaria que cada trabalhador tivesse de controlar pessoalmente, sem se dirigir a nenhuma lei exterior, não apenas a adaptação de seus esforços à obra a produzir, mas também a sua coordenação com os esforços de todos os outros membros da coletividade."
 
* "[...] Diz-se muitas vezes que a força não pode domar o pensamento; mas para que isto seja verdade, é preciso que haja pensamento. Onde as opiniões irracionais tomam o lugar de ideias, a força pode tudo. É injusto dizer, por exemplo, que o fascismo anula o pensamento livre; na verdade, é a ausência de pensamento livre que torna possível impor pela força doutrinas oficiais inteiramente sem significado. [...]"
 
===Religião===